Os números: português vs. polaco

Escrito por 28.10.16
Sabem qual é a melhor forma para se aprender os números? Ir ao estrangeiro e ter uma obrigação de fazer compras no mercado. Ou numa loja pequena onde não há oportunidade para evitar a conversa com o vendedor. Um verdadeiro paraíso começa nos países onde se pode negociar o preço. Por exemplo na Turquia. Viajar à boleia por cinco semanas por todas as regiões deste país foi uma ótima escola não só da cultura e das tradições turcas, mas também da língua (não pensem que falo turco – aprendi só 50-60 palavras, mas eram suficientes para não me perder lá; e fazer as conversas: embora limitadas, eram muito interessantes).   

Claro que, tudo é possível, assim como comunicar sem palavras apenas com os gestos e mímica, mas o conhecimento das palavras às vezes simplesmente facilita tudo. Não sei como é com vocês, mas eu aprecio muito o sentido de conseguir sobreviver numa outra parte do mundo. E contar na língua estrangeira é uma dessas superpowers que me permitem sentir confiante pelo menos a comprar algumas frutas ou lembranças num mercado.   

Talvez seja uma vergonha, mas a contar bem em português e saber dizer quinze sem repetir sempre: “onze, doze, treze, catorze, quinze (!)” na minha cabeça aprendi só este ano. Não era em Portugal. Era na… Bolivia. Eu sei, eu sei – o português NÃO É espanhol, mas têm de admitir que os números nestas duas línguas são parecidos. Também o russo está mais distante do polaco do que maioria do mundo pensa, mas sem dúvida a razão pela qual nós, polacos, não temos nenhum problema de contar em russo é que os números são muito semelhantes uns aos outros.   

Em Portugal faço as compras normalmente no Pingo Doce, Lidl, Continente. Então, nunca tive nenhuma necessidade de aprendê-los bem. Na Bolivia não havia outra solução – para não ficar logo sem dinheiro assim que chegámos lá, tive de usar os números fluentemente, negociar os preços e parecer como se o espanhol fosse a minha segunda língua, após o polaco. Graças ao conhecimento do português fui capaz fazer as conversas em espanhol – se calhar não muito finas, mas suficientes para não deixar alguém enganar-me.    


A minha primeira aula do português. E vossa do polaco  

Os números encontrei pela primeira vez na minha primeira aula de português. Lembro-me disso como se fosse ontem. Na verdade foi há muito tempo atrás – já vos disse que ser sistemática é o oposto da minha natureza, portanto esta aprendizagem prolonga-se há muitos anos. Em comparação ao polaco não é nada difícil em contar em português. Só se precisa de memorizar tudo. E pronto. Está feito. Até as diferenças entre os géneros, tais como um, dois no masculino e uma, duas no feminino, são um grande prazer para os quais aprendem ou falam língua polaca. A sério: os números são das coisas mais loucas em polaco. Nem sempre os próprios polacos conseguem utilizá-los corretamente.

Por exemplo em polaco temos cinco 2 básicos. São as formas: dwa, dwaj, dwóch, dwie, dwoje utilizadas só no caso que se chama «nominativo» (os casos existiam no latim). Dizemos:

  • dwa psy (dois cães – utilizamos para tudo o que é da forma neutra ou masculina e simultaneamente não é um homem);
  • dwaj mężczyźni (dois homens – utilizamos para a forma masculina, além disso que significa um homem);
  • dwóch mężczyzn (também dois homens, mas aqui a forma dwóch é outro caso, o «dativo»; semanticamente são iguais, muda-se “apenas” a estrutura da frase);
  • dwie kobiety (duas mulheres);
  • dwoje ludzi (duas pessoas que pode significar: um par masculino-feminino, criaturas imaturas como crianças ou os substantivos que têm só plural).

Estes são os básicos. Depois começa-se a declinação verdadeira: sete casos – as sete formas diferentes para cada da forma mostrada lá em cima – que utilizamos dependendo do contexto. E é apenas um numero: dois. O resto é...

...não. Não vou mostrar-vos o resto porque queria ter alguns seguidores do meu blog.


O português na Polónia

Escrito por 25.10.16
Pronto. Já conhecem a história do papel higiénico que aconteceu num dos parques de campismo em Portugal. Mas não pensem que foi exatamente esta situação graças à qual decidi aprender português. Nada disso. É verdade que naquele momento em frente da casa de banho queria ajudar uma criança, mas simultaneamente não passei por nenhuma iluminação, nem comecei a ter necessidade de completar uma missão estranha.   

A vontade de aprender português já estava viva em mim há muito tempo, mais ou menos desde os sete anos. Todavia deixem-me esconder a verdadeira razão disso – não era nada de interessante. Eram apenas os sonhos de uma menina de quinze anos. Mas também os sonhos de uma menina que nasceu extremamente teimosa e que nunca desistiu do que já tinha decidido. Até que precisei de esperar anos para atingir o meu objectivo. Na vida cheia de decisões para tomar é melhor decidir sobre algo de uma vez por todas e trabalhar para atingir esse objectivo – isso significa menos problemas e menos dúvidas.


Nessa altura, quando tinha quinze anos, ainda não estávamos na era da internet. Não podia ligar o computador e pesquisar facilmente sobre sites escritos em português. Além disso, não tinha dinheiro para aprender uma língua tão exotica como o português. Sim, tenho impressão que ainda hoje, depois de mais quatorze anos, o coreano ou o japonês são muito mais populares do que o português. Parece ser incrível, mas é a verdade: em geral na Polónia não há grande necessidade de se aprender esta língua. Porquê? Não sei.   

Embora viva numa das maiores cidades da Polónia, não consegui começar nenhum curso de português numa escola de línguas. Os cursos do meu nível, que ainda não está muito avançado, não se abrem, nem abrirão. Há vários cursos interessantes, mas só nas cidades onde funcionam as faculdades de língua portuguesa e não são tão perto da minha região. Talvez seja mais fácil aprender a versão brasileira. Uma coisa é certa: aqui (quando não se vive em Warszawa, Kraków, Lublin, Poznań ou em outra cidade onde o acesso às aulas de português é mais fácil) quando se quer, pode-se aprender português, mas precisa-se de ter uma vontade real. Caso contrário, é fácil desistir das procuras que as vezes exigem muito tempo.   

Contudo, ultimamente tenho visto uma mudança na questão profissional. A Polónia é um país que se está a desenvolver. Portanto a cada ano surgem mais empresas internacionais nas quais se constroem equipas que falam uma língua específica, entre outros o português. Espero que um dia no futuro consiga trabalhar numa delas.   

Sabem, os sonhos das pessoas teimosas as vezes realizam-se. 

Com uma determinação nos olhos

Escrito por 17.10.16
Portugal, 2009

Não me lembro muito bem se era ele ou ela. Aliás, nem sempre é fácil reconhecer o sexo quando a criança tem mais ou menos seis anos. A única coisa que ainda – depois de sete anos – está viva na minha cabeça são os olhos dele. Ou dela. Os olhos grandes. Os maiores olhos que já vi na minha vida. São estes os quais tem o gato do Shrek são maiores mas o gato desenhado é nada mais do que uma ficção. A criança era verdadeira. E estava a olhar para mim com os seus olhos enormes e castanhos. E com ambos uma tristeza profunda e determinação neles...


– Dê-me um papel, se faz favor – pediu a criança.
– Humm? – não entendi.
– Um papeeeel, por favoooor – a tom da voz tornou-se drastico.
– Nie rozumiem, przepraszam (Não entendo, desculpa).

Mas a criança não queria desistir. Estava na minha frente e nem pensava em se ir embora. A cada segundo ficava mais e mais determinada.

– Papeeeeeel, dê-me papeeeeeeeel – implorava.

A sério, já consegui reparar que o assunto é grave mas não fazia nenhuma idea, como é que eu podia ajudar. Habituei-me às situações como assim: estar na terra onde se fala uma língua totalmente estrangeira para mim e encontrar lá as pessoas que falam só esta língua. A maioria deles não tenta mostrar com gestos o que é que quer de mim, nem fala sobre isso noutras palavras, talvez mais reconhecíeis. Em vez disso repete teimosamente o mesmo cem vezes, mais alto ou mais devagar. E eu continuo sem entender nada. E sorrio envergonhada.

Mas está situação era diferente. Sabia que a criança precisava de algo de mim e só EU é que podia resolver o problema dela. Mas só Deus sabia o que é que ela estava a repetir tantas vezes. Então ficávamos cara à cara sem a mínima compreensão uma de outra.

Finalmente o desespero da criança tinha crescido até ao nível máximo e, de repente, inventou a maneira para eu entendê-la. Disse:

– Um papel – e mostrou um rolo de papel higiénico que se encontrava na minha mão.
– Aaaaaah – finalmente percebi.
– Masz, trzymaj (Toma, segura) – dei-lho.

A criança, feliz, correu à casa de banho.


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Tudo aconteceu quando estava em Portugal pela primeira vez. Apenas por uma semana, sem saber falar. Embora a ideia de aprender português nasceu quando tinha 15 anos (sete anos antes da história com a criança), a decisão real foi tomada apenas quando voltei desta primeira viagem. Apesar de ter, desde então, mais pausas do que o tempo da aprendizagem, já sei o que significa a palavra “papel”.

Na maneira fraca

Escrito por 13.10.16


Quem de nós não gosta de ler os textos bem escritos: engraçados, corretos e, além disso, interessantes? Os textos viciantes, cheios de humor brilhante nos quais o jogo da linguagem é comum?

Aqui não encontram nada disso. Desculpem.

Sei escrever. E faço-o bem. Mas em polaco. O português é outra historia.

Lembram-se dos tempos quando eram as crianças? Já tinham conhecido imensas palavras e podiam falar sem parar. Contudo isso o que construíam eram apenas estruturas básicas, não muito sofisticadas e abstratas. Tudo era muito direto. O conhecimento dos contextos mais avançados, da realidade linguistica ligada à vida social e cultural veio mais tarde. 

Encontro-me mais ou menos neste ponto. Entre jardim de infância e escola primária. Mas – chegou a hora de crescer.

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